Posar para uma foto pode parecer algo simples para alguns. Mas, para outros, a fotografia está repleta de traumas de momentos passados que não são mais bem-vindos. É o caso da nutricionista Albênia Maria, que participou do Projeto Mulheres Singulares, criado por mim em parceria com a maquiadora Aline Costa.
Na live “Meu corpo é singular: relacionamento com o corpo e a fotografia”, que aconteceu no meu instagram (@denisemarcalfoto), e contou com a participação da própria Albênia, conversamos sobre como o ensaio sensual resgata esse olhar para o amor próprio.
Para ela, participar de um ensaio sensual, foi um verdadeiro desafio, mas um importante passo para aprender a se olhar com mais carinho e cuidado. Isso porque, não era habitual olhar para si mesma. “Sou nutricionista e mulher gorda. Me sinto muito grata por contar a minha história, mostrar resiliência e aprender a ter uma observação mais sutil e delicada sobre mim mesma. Eu me negligenciava. O que me lembro era de ter uma relação com o meu corpo, o qual eu simplesmente não notava, não olhava para ele”.
Tudo o que refletia a si mesma, ela evitava. “Isso foi piorando quando eu percebi, ainda na infância, que meu corpo não era do tamanho que a sociedade esperava. Ele não cabia nos encaixotamentos sociais. Ter essa percepção foi difícil. Então eu parei de me olhar, evitava os espelhos. A fotografia também sempre foi algo delicado, eu preferia não me ver”.
Com o tempo, porém, ela foi entendendo seus limites e aprendendo a respeitá-los. “Eu não subo em uma balança há anos. E não me culpo por isso, está tudo bem para mim. Decidi que se algo está me causando dor, eu não me forço. É meu contexto, meu jeito. Fui aprendendo a ser mais gentil comigo mesma, porque há uma cobrança constante e isso aprisiona a gente. Todo mundo se torna vigilante do seu corpo”.
Ensaio boudoir
Convidei a Albênia para fazer um ensaio boudoir para o Projeto Mulheres Singulares, um portfólio artístico que criei em parceria com a maquiadora Aline Costa. A princípio, houve um receio por parte dela, mas ela decidiu encarar o desafio.
“Eu tive medo de fazer as fotos. Achava que eu ia ficar feia e que eu poderia, inclusive, decepcionar a própria Denise. Mas, a manhã da sessão foi um momento muito especial. Eu vivi um verdadeiro romance comigo mesma. Teve uma hora que a Denise me pedia para eu massagear os cabelos, dançar. E isso era uma coisa que eu nunca tinha feito. Foi muito especial”.
Eu vivi um verdadeiro romance comigo mesma.
Albênia Maria
Foi quando os resultados chegaram que ela percebeu que algo dentro dela tinha mudado. “Eu não quis fazer o que eu sempre faço, que é ficar dando zoom nas fotos e procurando meus defeitos. Pelo contrário, eu olhei uma por uma por inteiro, porque eu simplesmente não conseguia ver defeito em mim. Eu não trouxe para mim os julgamentos de uma vida inteira. E não foi um milagre, mas, no primeiro momento, eu só quis me admirar, é uma questão de autoestima”.
Ajudando outras mulheres
Albênia reforça que é preciso trabalhar a auto aceitação para que os padrões impostos não abalem a autoestima. “Lembro que eu comecei a me aceitar melhor quando eu vi o significado do meu nome, que é nobre fofa. Pensei: sou eu. Me reconheci ali. Meu formato é esse. Sou uma mulher gorda e sempre fui assim. Entendi que ser gordo não é triste, triste é o olhar de julgamento das pessoas. O gordo virou algo pejorativo”.
Para ela, isso é reflexo de inúmeras questões enraizadas. “A gente vive em uma sociedade em que para sermos bonitas precisamos fazer sacrifícios. A mulher vende, então precisamos estar inadequadas para que a indústria consiga nos fazer gastar. Eu já tive vários relacionamentos em que o cara só queria ficar comigo se ninguém visse. Porque eu tinha um corpo grande e ninguém podia ver. Um homem pode até sentir prazer por uma mulher gorda, mas não assume. Porque entende-se que somos desleixadas”.
Dentro de sua própria profissão, ela compreendeu o quanto a sociedade aprisiona mulheres gordas. “Ser nutricionista e gorda é sinônimo de incompetência para muitos. Mas não é bem assim, trata-se, apenas, de uma forma de corpo. Na nutrição, nós estudamos cálculos, alimentos, mas não os contextos que esse corpo está inserido. Bem como as políticas, a militância. Então, por muito tempo, atender mulheres gordas era sofrido, porque eu tinha que passar uma dieta restrita, baseada na matemática, e isso acaba aprisionando ainda mais essas pessoas”.
A partir disso, ela decidiu buscar o lado comportamental da nutrição, a fim de auxiliar mulheres gordas. “Hoje tenho o foco de atender só elas, mas não para fazer cálculos para que elas emagreçam, mas sim a fim de acolhê-las”. Com o tempo, ela aprendeu a deixar tudo mais simples e menos doloroso. “Eu compreendi que tudo é uma caminhada. E que tem dias que eu estou bem, mas em outros, não estou. E está tudo bem. Não preciso ser julgada, preciso ser amada. E esse amor deve começar por mim”.
O ensaio sensual como resgate
A fotografia boudoir pode ser uma aliada nesse processo de cura e transformação do nosso olhar sobre nós mesmas. Com mulher, sei o que é viver uma autoestima fragilizada, que nos paralisa diante de desafios e nos deixa vulnerável a relacionamentos abusivos. Foi por isso que direcionei o meu trabalho na fotografia às mulheres, pois quero ajudá-las nesse resgate e transformação do olhar sobre si, uma jornada que sigo vivendo. Saiba mais sobre isso aqui.
*Esta matéria teve a colaboração de Natália Macedo.